A CAVEIRA
O crânio era a taça ideal para se beber o sangue do
inimigo valoroso
A caveira humana
é tradicionalmente um símbolo da mortalidade e da vaidade nesta vida terrena,
além de ser um sinal de aviso e uma ameaça. Duas crenças comuns em todo o
mundo, aceitas pela humanidade presente e passada, são a de que os ossos
constituem o centro da energia psíquica e de que a cabeça é a sede da alma.
Até o século 17 foi aceito o fato científico que a alma corria
pelos fluídos dos centrículos do cérebro, enquanto até mesmo em nossos dias
há uma tendência de aceitar a mente como um dos aspectos do espírito. Esses
temas básicos tiveram profunda influência nas atividades religiosas, através
dos tempos.
Numa caverna de Ofnet, entre Augsbusg e Nuremberg, fora
descobertas coleções de caveiras, talvez relíquias de uma cultura européia
primitiva. Apenas numa caixa, havia 27 crânios, cada um voltado para a
direção do oeste, sem dúvida para o lado místico da terra dos mortos.
Túmulos modernos também mantêm a direção leste-oeste.
Pela descoberta de um grande número de crânios
enterrados separadamente do resto do esqueleto, é evidente que alguma forma de
sepultamento de duas partes foi realizada em tempos antigos. É largamente
aceito por arqueólogos e historiadores que, desde o começo do período
pleistoceno, esses sepultamentos foram realizados, após a retirada do cérebro,
provavelmente para servir de alimento.
Muitos trabalhos artísticos decoraram crânios humanos,
alguns pintados de vermelho e outros enfeitados com conchas marinhas. No Egito,
os arqueólogos descobriram curiosos deformações do cranianas, conseguidas
pelo processo de amarrar as cabeças ainda tenra das crianças. E, na Idade da
Pedra eram realizadas trepanações para aliviar os doentes: a causa das dores
de cabeça ou outros sofrimentos vazava pelo lugar operado. E muitas delas foram
realizadas com muita perícia, pois ficou provado que inúmeros pacientes
sobreviveram às operações por muitos anos.
Antigos nobres acreditavam que o céu, com sua
abóbada, era formada pelo crânio do gigante Ymir. No texto sueco de uma velha
balada fala-se que o desenho de um violino foi inspirado num crânio mágico. Os
alquimistas tinham a caveira como receptáculo de transmutação, ou mudança
psíquica.
CRÂNIOS DE MÁRTIRES E SANTOS
Em 1895 foi descoberto que a parede esquerda da
igreja de Darrington repousava sobre um infeliz que fora aparentemente
enterrado vivo, cerca de 600 anos antes. Crânios de inimigos foram numa época,
muito populares como taças especiais: bárbaros escandinavos e alemães
usavam-no para beber o sangue de inimigos valorosos, possivelmente para adquirir
sua força. Contudo, entre os povos do Extremo Oriente, somente os crânios
tivessem sido limpos por abutres é que serviam para tais taças.
Até o século passado, por exemplo, piedosos
peregrinos iam até o poço de Llandeilo, em Gales de Sul, para beber água no
crânio de São Teilo. Crânios de Santos eram constantemente vistos em igrejas
em toda a Europa, mas, nos países protestantes, poucos sobreviveram à reforma
do século 16. Nas áreas católico-romanas da Europa, contudo, milhares de
crânios de mártires e santos são conservados nas igrejas , como testemunhas
de que a caveira ainda é um poderoso símbolo religioso.
Os crânios das 11 mil virgens sagradas de Colônia
devem constituir uma visão impressionante para os crentes. Mas há, também, os
enganos seculares: uma relíquia preservada como o crÂnio de São Thorlac, em
Skalhout, na Islândia, mais tarde foi identificada como uma casca de como ali
jogada pelo mar. Em Nova Caledônia, faziam-se peregrinações para homenagear
os crÂnios dos antigos chefes e guerreiros. O povo wa, da Indochina, oferecia
seus crânios como presente aos ancestrais desaparecidos.
Acredita-se que o costume de guardar a caveira como
troféu nasceu do antigo costume (hoje ainda praticado por algumas tribos), de
fazer esporte com a caça às cabeças dos inimigos. Para o caçador de
cabeças, a caveira de um inimigo representava não apenas a prova da vitória,
como o aumento da própria força - então somada à força do oponente
conquistado. Na Nova Guiné, as caveiras dos inimigos eram dispostas em linha e,
à sua frente colocado o escudo do guerreiro que as conquistara: assim o
guerreiro continuava pela eternidade , a governar aqueles inimigos, perpetuando
a escravidão dos vencidos. Os caçadores de cabeça do Bornéo usavam as
caveiras dos inimigos como travesseiros.
Como símbolo, a caveira sempre aparece frequentemente
na arte. O pintor medieval Albrecht Durer sentia-se fascinado não apenas pelo
aspecto visual da caveira, como por seu simbolismo. O deus mexicano da morte,
Miclatecuhtli, um esqueleto com chapéu crônico, provavelmente é o
responsável pela forma dos brinquedos e doces das modernas crianças do
México, que freqüentemente tomam aspecto de caveiras.
A caveira com dois osso cruzados não é a marca
especial só dos piratas: aparece gravada em lápides mortuárias do século 17,
como lembrança da mortalidade. Modernamente, aparece como aviso em vidros de
veneno e até em instalações elétricas onde haja alta tensão.
Na magia e na medicina, a caveira desempenhou papel
relevante: na Idade Média, a epilepsia - tida como doença sobrenatural - era
às vezes tratada com o chamado "elexir do espírito do crânio
humano", preparado com o crânio insepulto de um criminoso. No século 17,
aspirar emanações provindas do pó raspado de caveiras era receitado como cura
certa de dores de cabeça. Quando a mágica foi cedendo lugar à ciência, essas
crenças retrocederam. Mas, ressurgiram depois, com a chamada
"ciência" da frenologia.
No século 18, o Dr. Franz Joseph Gall, de Viena,
expôs a intrigante teoria de que a figura física de uma pessoa determina seu
caráter e que, por isso, as faculdades de seu cérebro podem ser identificadas
pela forma de seu crânio. Mesmo que o culto do crânio tenha sido relegado a
papel quase nulo, a frenologia ganhou grande popularidade no século 19,
tanto na América, como na Europa.
No século 1, o escritor romano Tacitus notou um
curioso costume dos bárbaros alemães de exibir caveiras de animais em hastes e
árvores, como oferta de agradecimento ao deus Odin, por suas vitórias. Isso
não está extinto: até hoje, caçadores guardam como troféu as cabeças dos
animais que mataram.
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